Reforma política brasileira adota regras inexistentes no resto do mundo

O relatório da comissão da reforma política, que será votado nesta terça-feira (19) na Câmara Federal, vai na contramão dos modelos eleitorais discutidos e usados em todas as democracias modernas. O modelo do “distritão” e eleições sempre coincidentes para todos os níveis de governo não existem em praticamente nenhum lugar do mundo. Aqui, não se trata de uma inovação: na verdade, o modelo é único porque faz pouco sentido do ponto de vista democrático.
 
A principal mudança será a substituição do modelo atual de eleição de deputados e vereadores, o chamado voto proporcional em lista aberta, pelo modelo do “distritão” – que não deve ser confundido com o voto distrital. Esse novo modelo é o mais simples possível: os eleitos são os candidatos com maior número de votos. Por exemplo, o Paraná tem 30 cadeiras na Câmara Federal, e os eleitos seriam os 30 candidatos que receberam mais votos.
 
Relatório foi mudado de última hora
 
Mudanças de última hora forçaram o adiamento da votação do relatório na comissão pela Câmara. Entre a apresentação, na última terça-feira (12), e a data marcada para a votação, na quinta (14), o relator, Marcelo Castro (PMDB-PI), incluiu no relatório artigo que previa mandatos de seis anos para os próximos prefeitos eleitos e dez para os futuros senadores
 
Apesar de ser simples, esse sistema não é usado em nenhuma democracia moderna ocidental: hoje, apenas Afeganistão e Jordânia usam esse modelo de maneira uniforme. Isso acontece porque não há qualquer vantagem além da simplicidade. A tendência é o enfraquecimento dos partidos, da representação regional e o fortalecimento apenas dos candidatos “bons de voto”.
 
Outra “inovação” do Congresso é o estabelecimento de eleições simultâneas, com mandatos de cinco anos e sem reeleição para cargos no Executivo. Isso significa que, a cada cinco anos, votaríamos do vereador ao presidente. Para quem defende o modelo, isso reduz os custos operacionais das eleições e facilita as relações intergovernamentais.
 
Reforma “às pressas” não resolve os problemas coma corrupção no país
 
Imagine chegar ao consultório de um médico para reclamar de suas constantes dor de cabeça. De pronto, ele te dá um remédio para tratar problemas renais, e afirma, com convicção, que em poucos dias você estará curado. A resposta da classe política aos clamores populares por menos corrupção e melhores serviços públicos, em junho de 2013, foi mais ou menos assim
 
Trata-se de algo inédito. Como são esferas diferentes de poder, com competências distintas, faz muito mais sentido que esses debates sejam feitos cada um em seu momento específico. Em eleições concomitantes, é provável que o debate presidencial “sufoque” as discussões internas de cada município – parte da população votaria no prefeito e no vereador não por suas propostas, mas por seu alinhamento com outros níveis de governo.
 
Além disso, isso significaria que o eleitor só votaria a cada cinco anos, o que pode contribuir para o afastamento dos cidadãos em relação ao debate político. O relator da reforma, Marcelo Castro (PMDB-PI), chegou a incluir em seu relatório a previsão de um mandato de dez anos para os próximos senadores eleitos, mas voltou atrás e reduziu esse período para cinco. O próximo mandato de prefeito e vereadores seria de seis anos.
 
Outras mudanças
 
O relatório prevê outras mudanças importantes. A proposta mantém o modelo misto de financiamento de campanha, incluindo doações empresariais. Entretanto, há alterações nas regras. As empresas só poderão doar a partidos, e uma lei terá de ser aprovada determinando um teto porcentual e um teto nominal para essas doações – hoje, o limite é apenas porcentual.
 
O projeto também recria a cláusula de barreira. Partidos que receberem menos de 2% dos votos para deputado federal não poderão receber recursos do fundo partidário e não terão direito a tempo de televisão. Há, também, a previsão expressa de fidelidade partidária. Por fim, a apresentação de projetos de iniciativa popular foi facilitada: agora, será necessário a assinatura de apenas 0,5% dos eleitores do país – hoje, é preciso 1%.

Fonte: Gazeta do Povo